Obicetrapibe: A Nova Promessa Oral no Arsenal Contra o Colesterol Elevado?

Publicado no New England Journal of Medicine em 2025, o estudo BROADWAY traz à tona resultados animadores sobre o obicetrapibe, um potente inibidor seletivo da proteína de transferência de éster de colesterol (CETP), cuja promessa é reduzir significativamente os níveis de LDL-colesterol em pacientes com alto risco cardiovascular — mesmo aqueles já em uso de terapias hipolipemiantes máximas. A droga reapresenta, com sofisticação molecular, um caminho antes desacreditado: a inibição da CETP.

Contexto: Alvo no LDL, Mas Obstáculos na Prática Clínica

Embora as diretrizes recomendem metas cada vez mais baixas de LDL-c (especialmente <55 mg/dL para pacientes de muito alto risco), muitos pacientes não atingem esses níveis, mesmo com estatinas de alta intensidade, ezetimiba ou inibidores de PCSK9. O obicetrapibe surge como uma opção oral adicional, mais acessível e possivelmente com maior aceitação do que os agentes injetáveis.

Desenho do Estudo: Rigor e Relevância Clínica

O BROADWAY foi um ensaio clínico multinacional, duplo-cego e controlado por placebo. Incluiu 2.530 pacientes com doença cardiovascular aterosclerótica ou hipercolesterolemia familiar heterozigótica, todos sob terapia hipolipemiante máxima. Eles foram randomizados na proporção 2:1 para receber 10 mg/dia de obicetrapibe ou placebo durante 365 dias.

O desfecho primário foi a variação percentual do LDL-c em 84 dias, sendo também avaliados biomarcadores lipídicos adicionais, segurança e eventos adversos cardiovasculares.

Resultados Impactantes: Uma Nova Referência em Redução Lipídica?

✅ O obicetrapibe reduziu os níveis de LDL-c em 29,9% em 84 dias, versus aumento de 2,7% no grupo placebo — uma diferença absoluta de −32,6 pontos percentuais (p<0,001).
✅ 51% dos pacientes atingiram LDL-c <55 mg/dL e 27,9% chegaram a <40 mg/dL com a droga.
✅ Também foram observadas reduções importantes em:

  • Apolipoproteína B (−18,9%)
  • Colesterol não-HDL (−29,4%)
  • Triglicerídeos (−7,8%)
  • Lipoproteína(a) (−33,5%)

✅ Além disso, o HDL-c aumentou em até 136%, evidenciando o efeito clássico dos CETP-inibidores.

Segurança: Perfil Sólido e Sem Sinais de Alerta

O obicetrapibe apresentou perfil de segurança semelhante ao placebo:

  • Eventos adversos ocorreram em cerca de 60% dos pacientes, majoritariamente leves a moderados.
  • Eventos cardiovasculares maiores foram numericamente menores no grupo obicetrapibe (4,2% vs 5,2%), embora o estudo não tenha sido desenhado para avaliar desfechos clínicos.
  • Nenhuma diferença significativa em alterações hepáticas, renais, musculares ou no controle glicêmico foi detectada, o que contrasta positivamente com estatinas e inibidores de PCSK9.

O Renascimento dos CETP Inibidores?

Diferente de seus antecessores torcetrapibe, dalcetrapibe e evacetrapibe — que falharam por toxicidade ou ausência de eficácia —, o obicetrapibe não apresenta efeitos colaterais off-target, e sua ação primária parece claramente voltada à redução de LDL-c e ApoB, e não apenas ao aumento de HDL-c, que hoje se sabe ter benefício limitado isoladamente.

Este estudo, portanto, reposiciona os CETP-inibidores como potenciais protagonistas no controle lipídico, especialmente por via oral, com possível ampliação do acesso a pacientes fora de grandes centros ou intolerantes a injetáveis.

Conclusão: Teremos um Novo Player Oral de Alta Potência Contra o Risco Cardiovascular?

O BROADWAY não apenas validou a eficácia do obicetrapibe na redução do LDL-c em pacientes de alto risco como também reacendeu o interesse por uma classe de fármacos antes marginalizada. A próxima etapa — já em curso no estudo cardiovascular de desfecho (NCT05202509) — será provar que essa redução lipídica se traduz em menos infartos, menos AVCs e mais vida. Diante de tantos dados positivos, uma pergunta inevitável permanece: estamos prestes a testemunhar a chegada do primeiro CETP-inibidor oral verdadeiramente bem-sucedido na prevenção cardiovascular — ou ainda pairam incertezas sobre sua eficácia em desfechos clínicos de longo prazo?

Referência

Autor: Dr Marcelo Tavares – Cardiologista e Ecocardiografista

CRM Nº 9932 | RQE Nº 5331 (Ecocardiografia) | RQE Nº 5330 (Cardiologia)

Pós-doutor em cardiologia pelo Incor/USP, Dr. Marcelo é professor de semiologia na UFPB e editor-chefe da Cardiovascular Imaging.

Membro do Advisory Board Médico DrHub