Lurasidona Versus Antipsicóticos Típicos na Esquizofrenia: Revisão Cochrane Aponta Incerteza nas Evidências

Uma revisão sistemática publicada na Cochrane Database of Systematic Reviews (2025) avaliou a eficácia e segurança da lurasidona em comparação com antipsicóticos típicos, como haloperidol e perfenazina, no tratamento de adultos com esquizofrenia. Apesar do crescente uso da lurasidona como antipsicótico atípico, ainda havia uma lacuna de dados diretos comparando sua performance com os medicamentos típicos consagrados na prática clínica.

Metodologia da Revisão

Foram incluídos apenas dois ensaios clínicos randomizados, totalizando 308 pacientes com diagnóstico de esquizofrenia. Os estudos compararam diferentes doses de lurasidona (20, 40 e 80 mg/dia) com haloperidol (até 10 mg/dia) ou perfenazina (até 32 mg/dia), com período de seguimento de 4 a 6 semanas. Ambos os estudos foram conduzidos nos Estados Unidos.

Os desfechos primários avaliados incluíram alterações no estado mental (medidas pelas escalas BPRS e PANSS), ocorrência de eventos adversos graves e severos, além de desfechos secundários como uso adicional de benzodiazepínicos e mudanças na escala de impressão clínica global (CGI-S). Dados sobre qualidade de vida ou mortalidade (suicídio ou causas naturais) não foram reportados.

Principais Resultados

  • Sintomas psiquiátricos: A lurasidona apresentou leve melhora nas escalas BPRS (diferença média de 3,74 pontos) e PANSS (diferença média de 6,68 pontos) em relação ao haloperidol, mas ambos os achados são de muito baixa certeza. A diferença observada não atingiu os limiares mínimos de relevância clínica definidos para essas escalas.
  • Eventos adversos: Os riscos de eventos adversos graves foram semelhantes entre lurasidona e os antipsicóticos típicos (RR 0,98 para eventos graves; RR 1,70 para eventos severos). Eventos como sedação, sonolência, cefaleia, constipação e fadiga também não apresentaram diferenças significativas entre os grupos.
  • Global state (CGI-S): A diferença média na escala CGI-S foi de 0,23 pontos a favor do haloperidol, sem significância clínica clara.
  • Uso adicional de benzodiazepínicos: Foi semelhante entre os grupos, com tendência ligeiramente maior no grupo lurasidona, mas sem diferença estatística.

Limitações dos Estudos

Os dois estudos incluídos foram classificados com alto risco de viés. Faltaram informações claras sobre randomização, ocultação de alocação e mascaramento. Além disso, a taxa de descontinuação por ineficácia foi elevada e desigual entre os grupos. Uma das pesquisas (Potkin 2015) foi considerada “falha” pelos próprios autores, pois não encontrou diferenças significativas entre os braços ativos e placebo, levantando dúvidas sobre sua validade interna.

A evidência foi classificada como de muito baixa qualidade segundo a metodologia GRADE, principalmente por limitações nos desenhos dos estudos e pela imprecisão dos resultados.

Conclusão dos Autores

Os dados atuais são insuficientes para concluir se a lurasidona é superior, equivalente ou inferior aos antipsicóticos típicos no tratamento da esquizofrenia. Embora a lurasidona seja geralmente bem tolerada, com perfil metabólico favorável e menor risco de sedação, as evidências ainda não são robustas o suficiente para fundamentar decisões clínicas sólidas sobre sua superioridade em relação a agentes como haloperidol ou perfenazina.

A revisão destaca a necessidade urgente de ensaios clínicos maiores, com metodologia rigorosa e tempo de seguimento mais longo, que avaliem desfechos relevantes como recaída, funcionalidade, qualidade de vida, adesão ao tratamento e eventos adversos de longo prazo.

Referência
Storman D, Koperny M, Styczeń K, Datka W, Jaeschke RR. Lurasidone versus typical antipsychotics for schizophrenia. Cochrane Database Syst Rev. 2025;1:CD012429. doi: 10.1002/14651858.CD012429.pub2