O Impacto Econômico do Tratamento com Semaglutida em Pacientes Cardiometabólicos

A obesidade é uma condição crônica cada vez mais prevalente e de grande impacto na saúde pública global, especialmente por seu papel no desenvolvimento de doenças cardiometabólicas. O tratamento eficaz desse quadro tornou-se prioridade, e o advento de medicamentos como a semaglutida acendeu debates sobre custo, benefício e sustentabilidade para sistemas públicos de saúde como o SUS.

O Que é Semaglutida e sua Indicação?

A semaglutida pertence à classe dos agonistas do receptor de GLP-1, indicada como adjuvante ao tratamento de pacientes adultos com obesidade grau II e III (IMC ≥ 35 kg/m²), sem diabetes, e doença cardiovascular. Atua estimulando a produção de insulina, reduzindo glucagon e induzindo saciedade, promovendo perda de peso sustentável e melhora do perfil metabólico, além de favorecer redução de fatores de risco como hipertensão, dislipidemia e inflamação crônica.

Eficácia Clínica Comprovada

Estudos recentes, como os Programas STEP, demonstraram que a semaglutida proporciona perdas de peso superiores a outros agonistas do GLP-1, além de melhorias expressivas na pressão arterial, perfil lipídico e controle do apetite. Um dos principais avanços veio com o estudo SELECT, que evidenciou redução de 20% no risco de eventos cardiovasculares maiores em pacientes com obesidade e doença cardiovascular prévia, resultado considerado raro, mesmo com intervenções comportamentais intensivas.

Além disso, pacientes tratados com semaglutida apresentaram menor ocorrência de eventos adversos cardiovasculares graves, apesar de uma maior taxa de descontinuidade devido a efeitos gastrointestinais, geralmente reversíveis.

Impacto Econômico no Sistema Público

O principal desafio para a incorporação da semaglutida no SUS é o elevado impacto orçamentário. A análise econômica oficial estima que o custo por ano de vida ajustado à qualidade gerada pela tecnologia seria de R$ 34.000, podendo chegar a R$ 300.000 sob determinadas condições de tratamento. O projeto que, em cinco anos, a incorporação da semaglutida poderia acarretar gastos de R$ 3,4 bilhões a R$ 7 bilhões ao SUS, dependendo do tempo de uso e do perfil populacional atendido.

Apesar disso, estudos internacionais apontam que, a longo prazo, o uso da semaglutida pode gerar economias substantivas ao sistema de saúde ao reduzir internações, custos com complicações de obesidade, necessidade de múltiplas medicações e óbitos prematuros. O debate público reforça que o acesso à semaglutida representa mais que um gasto: é investimento estratégico e potencialmente transformador para a saúde populacional.

Perspectivas e Desafios

Relatos de pacientes indicam que a interrupção do uso da semaglutida, muitas vezes motivada pelo custo elevado, resulta em ganho de peso e agravamento de limitações funcionais e metabólicas, o que pode se traduzir em aumento recursivo de custos e piora da qualidade de vida. Entre profissionais de saúde, o consenso é de que a semaglutida representa avanço terapêutico, mesmo que o custo seja o principal desafio para ampliação do acesso no sistema público.

A recomendação inicial do Comitê de Medicamentos da Conitec foi desfavorável à incorporação da semaglutida no SUS, principalmente por considerar o alto custo incremental e a incerteza do tempo ideal de uso. A discussão permanece aberta em consulta pública, com especialistas recomendando que a avaliação de custo-efetividade seja ampliada para considerar impactos indiretos e a possibilidade de negociação entre moléculas equivalentes do mesmo grupo terapêutico.

Considerações Finais

A semaglutida mostra-se como uma das terapias mais promissoras para pacientes com obesidade grave e risco cardiovascular, com benefícios diretos à saúde individual e potencial de redução de custos sistêmicos a médio e longo prazo. A incorporação desse tipo de tecnologia impõe o desafio do financiamento, mas pode inaugurar uma nova era de abordagens farmacológicas, capazes de transformar o panorama da obesidade e suas complicações no Brasil e no mundo.

Referências

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