Novos Insights Sobre GLP1: Benefícios Neuroprotetores em Diabetes Tipo 2 e Obesidade

Pacientes com diabetes tipo 2 e obesidade enfrentam riscos elevados de doenças neurodegenerativas, acidente vascular cerebral (AVC) e mortalidade, fatores que complicam o manejo clínico e prejudicam a qualidade de vida. Um estudo recente publicado na JAMA Network Open trouxe avanços importantes ao evidenciar que dois agentes antidiabéticos modernos, o agonista do receptor GLP-1 (GLP-1RA) semaglutida e o agonista dual GLP-1/GIP tirzepatida, não só auxiliam no controle glicêmico e perda de peso, mas também apresentam um protetor significativo contra demência, AVC isquêmico e redução da mortalidade geral em pacientes com essas comorbidades.

Método do Estudo

Os autores realizaram um estudo coorte retrospectivo, envolvendo 60.860 adultos com diabetes tipo 2 e obesidade, com idade acima de 40 anos, selecionados a partir do banco de dados eletrônicos de registros de saúde do TriNetX dos EUA, no período entre dezembro de 2017 e junho de 2024. Metade dos participantes iniciou tratamento com semaglutida ou tirzepatida, enquanto a outra metade recebeu outros antidiabéticos (biguanidas, sulfoniluréias, inibidores de DPP-4 e outros). Pacientes com história prévia de doenças neurodegenerativas ou cerebrovasculares foram excluídos. O principal foi o aparecimento de demência, doença de Parkinson, acidente vascular cerebral (isquêmico e hemorrágico) e mortalidade por todas as causas. A correspondência de pontuação de propensão foi usada para equilibrar características básicas entre os grupos.

Resultados

Após seguimento médio de 1,77 anos, o grupo tratado com GLP-1RAs apresentou redução significativa no risco de:

  • Demência: Hazard Ratio (HR) 0,63 (IC 95% 0,50-0,81)
  • Acidente vascular cerebral isquêmico: HR 0,81 (IC 95% 0,70-0,93)
  • Mortalidade geral: HR 0,70 (IC 95% 0,63-0,78)

Não houve diferença significativa na incidência da doença de Parkinson ou hemorragia intracerebral. Subanálises indicaram que mulheres, pacientes com idade ≥60 anos e aqueles com IMC entre 30 e 40 kg/m² beneficiaram-se mais dos efeitos neuroprotetores. Destacou-se que a tirzepatida se associou a redução mais significativa no risco de AVC isquêmico e mortalidade, enquanto a semaglutida teve maior associação com redução do risco de demência.

Mecanismos e Contexto Clínico

O diabetes tipo 2 e a obesidade são caracterizados por resistência à insulina, estresse oxidativo e inflamação crônica, condições que aceleram a neurodegeneração e aumentam a vulnerabilidade a eventos cerebrovasculares. A ação dos GLP-1RAs vai além do controle glicêmico: estudos pré-clínicos demonstram que esses fármacos resultaram na deposição de placas amiloides, na hiperfosforilação do tau, na neuroinflamação, e melhoraram a função cognitiva em modelos experimentais de Alzheimer.

Semaglutida e tirzepatida, últimas gerações destas drogas, possuem perfis farmacocinéticos aprimorados e promovem maior perda ponderal, o que pode contribuir para a melhoria da função vascular cerebral e diminuição do risco de infarto cerebral. O neuroprotetor de impacto é sugerido por evidências clínicas que incluem redução da incidência de demência e mortalidade, corroborando resultados de ensaios prévios e estudos observacionais.

Implicações para a Prática Médica

Este estudo reforça o papel dos GLP-1RAs como uma estratégia terapêutica multifacetada em pacientes com diabetes tipo 2 e obesidade, proporcionando benefícios que vão além do metabolismo, com potencial para melhorar resultados cognitivos e de sobrevivência a longo prazo. Profissionais de saúde consideram esses efeitos ao selecionar tratamentos, principalmente em pacientes idosos ou com IMC moderado (30 a 40 kg/m²).

Além disso, o fato dessas drogas apresentam impacto positivo na incidência de AVC isquêmico ressalta a importância de sua utilização em um contexto cardiovascular mais amplo, incluindo a prevenção secundária.

Limitações e Recomendações Futuras

Por ser um estudo observacional, não é possível estabelecer causalidade definitiva, e os fatores residuais de confusão podem existir apesar do ajuste estatístico. Não houve confirmação de adesão medicamentosa ou análise detalhada de biomarcadores neurológicos. Ensaios clínicos examinados focados nos efeitos neuroprotetores e cerebrovasculares de semaglutida e tirzepatida são necessários para confirmar essas associações e explorar os mecanismos subjacentes.

Conclusão

O uso de semaglutida e tirzepatida está associado a um menor risco de demência, AVC isquêmico e mortalidade em pacientes com diabetes tipo 2 e obesidade, trazendo efeitos neuroprotetores e cerebrovasculares além do controle glicêmico. Estes achados sugerem uma nova dimensão terapêutica para GLP-1RAs, contribuindo para abordagens integradas na gestão dessas doenças complexas.

Referências

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