A The Lancet Psychiatry publicou um consenso internacional pioneiro sobre o manejo clínico do transtorno depressivo maior (TDM) com obesidade, propondo um modelo integrado de cuidado físico e mental.
A revisão destaca que depressão e obesidade formam um ciclo bidirecional sustentado por alterações inflamatórias, hormonais e comportamentais. Segundo os autores, essa comorbidade agrava o prognóstico psiquiátrico e metabólico, mas ainda carece de diretrizes específicas para rastreamento e tratamento conjunto.
Pontos-chave da revisão
1. Rastreamento e monitoramento sistemático
- Avaliar IMC, circunferência abdominal, lipídios, glicemia e pressão arterial em todos os pacientes com TDM.
- Investigar causas endócrinas (hipotireoidismo, síndrome de Cushing, apneia do sono).
- Incluir hábitos alimentares, atividade física, sono e histórico de trauma no plano clínico.
2. Antidepressivos e risco metabólico
- Evitar fármacos com alto potencial de ganho ponderal (mirtazapina, tricíclicos, paroxetina).
- Preferir opções mais neutras ou com efeito favorável, como bupropiona, venlafaxina e agomelatina.
- Considerar terapias não farmacológicas para casos resistentes, como TMS, ECT e esketamina, que são metabolicamente neutras.
3. Psicoterapia e comportamento alimentar
- A terapia cognitivo-comportamental (TCC) segue como a mais indicada para sintomas depressivos, mas seus efeitos sobre peso ainda são modestos.
- Estratégias de “terceira onda” (como Acceptance and Commitment Therapy) podem reduzir alimentação emocional e culpa corporal.
4. Exercício e estilo de vida
- 150 minutos/semana de atividade moderada (como caminhada ou treino aeróbico) reduzem sintomas depressivos e circunferência abdominal.
- Exercícios matinais podem melhorar glicemia e sono; à tarde, reduzem triglicerídeos.
5. Intervenções nutricionais
- Dieta mediterrânea e restrição calórica moderada (–500 kcal/dia) reduzem depressão e risco cardiometabólico.
- Dietas cetogênicas e jejum intermitente mostram resultados promissores, mas ainda carecem de evidência robusta em depressão.
6. Novos fármacos antiobesidade
- Agonistas de GLP-1 (liraglutida, semaglutida, tirzepatida) demonstram segurança psiquiátrica e melhora de humor em estudos pós-hoc.
- A incidência de ideação suicida é baixa (≈0,1–0,3%), mas recomenda-se monitoramento do humor durante o tratamento.
Recomendações práticas (The Lancet Framework)
- Integrar rastreamento metabólico à rotina psiquiátrica.
- Evitar polifarmácia e priorizar antidepressivos neutros quanto ao peso.
- Prescrever exercício e reeducação alimentar de forma estruturada.
- Oferecer apoio psicoterápico para manejo emocional e adesão.
- Considerar fármacos antiobesidade (GLP-1, bupropiona/naltrexona) em casos selecionados.
- Adotar abordagem multidisciplinar, incluindo psiquiatra, endocrinologista, nutricionista e educador físico.
Mensagem Final
O documento propõe uma mudança de paradigma: tratar a obesidade como parte da depressão, e vice-versa.
A integração entre psiquiatria e medicina metabólica, defendem os autores, é essencial para reduzir morbidade, mortalidade e estigma em uma das comorbidades mais desafiadoras da atualidade.
Referência
Opel N, Hanssen R, Steinmann LA, Foerster J, Köhler-Forsberg O, Hahn M, Ferretti F, Palmer C, Penninx BWJH, Gold SM, Reif A, Otte C, Edwin Thanarajah S. Clinical management of major depressive disorder with comorbid obesity. Lancet Psychiatry. 2025 Oct;12(10):780-794. doi: 10.1016/S2215-0366(25)00193-2.





