A combinação do diabetes tipo 2 (DM2) com a doença arterial periférica (DAP) representa um desafio clínico complexo e frequente, afetando milhões de pessoas no mundo todo. Pacientes com DAP frequentemente apresentam claudicação intermitente — uma dor nas pernas que surge durante a caminhada e limita bastante a mobilidade e a qualidade de vida. Até recentemente, as opções terapêuticas específicas para melhorar a função e o desempenho físico nestes casos eram bastante limitadas. Nesse cenário, o estudo STRIDE (Semaglutide Treatment for Functional Improvement in Peripheral Artery Disease with Type 2 Diabetes) emergiu como um marco importante no tratamento integrado.
Sobre o Estudo STRIDE
Conduzido entre 2023 e 2025, o STRIDE foi um ensaio clínico multinacional, planejado, duplo-cego e controlado por placebo, que envolveu quase 800 pacientes com DM2 e DAP sintomática, especificamente indivíduos classificados como Fontaine IIa — ou seja, com claudicação intermitente leve a moderada. Os participantes receberam dose semanal de semaglutida 1,0 mg ou placebo, e foram acompanhados durante 52 semanas para avaliar o impacto do tratamento na capacidade funcional, qualidade de vida e estágios vasculares.
Resultados Cruciais
- Melhora na Capacidade Funcional: A principal medida de eficácia foi a razão da distância máxima que os pacientes conseguiram caminhar numa caminhada ao final de 52 semanas. Os pacientes tratados com semaglutida obtiveram uma melhora significativa, caminhando em média até 37 metros a mais do que aqueles que receberam placebo, uma diferença que tem impacto direto na autonomia e rotina diária.
- Aumento na Distância Sem Dor: Além da distância total, também houve aumento na distância que os pacientes puderam caminhar sem sentir em dor, mostrando que os benefícios do tratamento vão além da simples resistência, traduzindo-se em melhor conforto e menor sintomatologia.
- Qualidade de Vida: Avaliações por questionários específicos de qualidade de vida relacionados à saúde vascular (VascuQoL-6) indicaram melhorias clinicamente relevantes, reforçando o benefício global do tratamento em múltiplos pilares da saúde do paciente.
- Eventos Adversos e Segurança: A semaglutida manteve um perfil de segurança consistente com os estudos anteriores, sem aumento significativo de eventos graves. Os efeitos colaterais mais comuns foram gastrointestinais, geralmente leves e transitórios, sem impactar a adesão ao tratamento.
Por Que Esses Resultados São Relevantes?
Tradicionalmente, os tratamentos para DAP focavam principalmente no controle dos fatores de risco, uso de antiagregantes e cirurgias cirúrgicas em casos avançados. No entanto, não existiam muitas alternativas farmacológicas eficazes para melhorar a capacidade funcional e a qualidade de vida a médio e longo prazo.
A semaglutida, um agonista do receptor de GLP-1 já reconhecido por seu papel no controle glicêmico e proteção cardiovascular, demonstrou no STRIDE um efeito terapêutico complementar — melhorando a perfusão, funcionalidade muscular e possivelmente mecanismos metabolopatológicos associados ao DAP. Isso representa uma esperança substancial para milhões de pacientes que sofrem com especificações físicas em decorrência da doença.
Implicações Clínicas
Este estudo reforça a necessidade de uma abordagem multidisciplinar e integrada, combinando controle metabólico específico com tratamento direto das complicações vasculares. A semaglutida pode, portanto, oferecer um duplo benefício: controlar o diabetes aprimorado e simultaneamente melhorar a mobilidade e a qualidade de vida em pacientes com DAP.
Próximos Passos e Recomendações
Embora os resultados do STRIDE sejam animadores, recomenda-se que os profissionais de saúde considerem:
- Avaliar individualmente os pacientes para identificar aqueles com maior potencial de benefício.
- Monitorar efeitos adversos, especialmente gastrointestinais, durante o início do tratamento.
- Integrar o uso da semaglutida com outras estratégias, como reabilitação vascular e ajustes terapêuticos personalizados.
- Promover estudos adicionais para avaliar o impacto a longo prazo nos eventos cardiovasculares, hospitalizações e mortalidade.
Referências
- Bonaca MP, Gibson CM, Rocha-Singh KJ, et al. Semaglutida para melhora funcional na doença arterial periférica com diabetes tipo 2 (STRIDE): um ensaio clínico randomizado. Lancet. 2025;405(10346):1161-73.
- Colégio Americano de Cardiologia. O estudo STRIDE mostra que a semaglutida melhora a capacidade funcional em pacientes com doença arterial periférica e diabetes tipo 2. 2025 abr 2 [acesso em 2025 ago 6].
- Novo Nordisk. ADA 2025: Ozempic® (semaglutida 1,0 mg) recomendado após os resultados do estudo STRIDE. 2024 set 26 [citado em 2025 ago 6].